sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Distribuição socialmente justa da renda

Por, Jose Calixo Souza Filho

Do ponto de vista da ética e da moral, a distribuição da renda de um país é defendida pela maioria das pessoas. Em tese, todos defendem uma distribuição de renda justa. A teoria econômica deixa evidente que a distribuição de renda é uma medida racional e inteligente, que traz consigo muitos benefícios para a economia. Uma renda bem distribuída aumenta e diversifica a demanda agregada de um país, dando poder de compra para a maior parte das famílias. Se as famílias, como agente econômico, têm seu poder de compra aumentado e diversificado, elas vão contribuir para um aumento da produção de bens e serviços, igualmente diversificados.

Para melhor ilustrar a afirmação anterior, vamos imaginar um país composto por apenas dez pessoas com renda total de R$ 100,00 e com a seguinte distribuição de renda:

·    Apenas uma única pessoa recebe a renda total de $ 100,00 (não existe). Supondo que esta pessoa comesse somente chocolate (ou qualquer outro produto) e sua capacidade de comer chocolate até se fartar consumisse apenas $ 20,00. A demanda agregada desse país seria somente de chocolate e, como consequência, só existiriam fábricas de chocolate. A concentração da renda nas mãos de uma pessoa deixou $80,00 ociosos e produziu empregos somente na fábrica de chocolate, o que provavelmente reduziria a possibilidade de crescimento da economia, não se tornando uma economia dinâmica, mas, sim, atrasada e pobre.

·    A renda seria distribuída de forma igualitária entre as pessoas, uma perfeita distribuição da renda (não existe). Supondo que cada uma as pessoas gostem de dez produtos diferentes e que gastariam toda sua renda na compra desses produtos, o resultado para a economia seria fantástico, pois a demanda agregada seria bastante diversificada e, em contrapartida, a produção seria também muito diversificada. O mais importante é a não existência de recursos ociosos na economia. Se a concentração fosse total como na primeira situação, $80,00 estariam sem utilidade para o sistema econômico.

Como podem ver, a distribuição de renda é mais do que um fator de justiça, sendo a uma das formas mais inteligentes de promover o crescimento e principalmente o desenvolvimento econômico[1]*. Existem vária formas de promover a distribuição de renda, entre elas, as políticas de compensações sociais do tipo bolsa família, bolsa educação e outras, que serão mais bem explicadas quando for tratarmos dos instrumentos de políticas macroeconômicas.

Política fiscal

A política fiscal é um dos instrumentos de política macroeconômica utilizada pelo governo para alcançar os objetivos macroeconômicos citados anteriormente.

A política fiscal se define pela tributação da sociedade resultante da receita do governo quando arrecada impostos, taxas e contribuição dos agentes econômicos e, por outro lado, o gasto do governo. A forma como o governo tributa e a forma como gasta é de fundamental importância para a economia e para a sociedade.

A política fiscal provoca muita polêmica, já que sua essência reside na tributação, que retira renda dos agentes econômicos utilizada para sustentar o Estado que é uma instituição essencial para garantir a existência da sociedade. Os mais importantes economistas reconhecem a importância do estado como organizador do sistema econômico. Os economistas clássicos, como Adam Smith, e os novos liberais, como Milton Friedman e Hayek, entendem que a função do Estado é a de proteger o mercado, garantir os contratos, promover a segurança interna e externa e, principalmente, garantir a liberdade dos indivíduos em sua ação econômica. Esses economistas acreditam em um Estado democrático, controlado pela sociedade, capaz de criar normas e leis que garantam a liberdade dos indivíduos. Friedman, em seu clássico Capitalismo e Liberdade, capítulo II PP 14 e 15, qundo trata do papel do governo na economia, traduz o termo livre da seguinte forma:

“ Nos U.S.A, Livre significa a liberdade que todos tem  de fundar uma empresa. O que significa que as  as empresas existentes não tem a liberdade para eliminar os seus competidores, a  não ser com produtos melhores ao mesmo preço ou preços mais baixos”.
Friedaman continua expondo seu pensamento  e conclui sobre como o governo deve atuar na economia:
“ Em suma, a organização de atividade econômica através da troca voluntária, presume-se que se tenha providenciado, por meio do governo, a necessidade de manter a lei e a ordem para evitar coerção de um indivíduo pelo  outro; a execução de contratos voluntariamente estabelecidos, a definição do significado do direito de propriedade, a sua interpretação; o fornecimento de uma estrutura monetária”.

Karl Marx acredita no estado como promotor da igualdade e justiça na divisão do produto econômico e defende que o Estado seja o dono dos fatores de produção e o planejador das atividades econômicas.
Keynes propõe um Estado ativo na economia, regulando as atividades econômicas, orientando os agentes econômicos pela ação do governo. Ele é o idealizador do Estado do bem-estar econômico e social, também conhecido como Estado previdenciário.

Quando estudamos as teorias desses grandes economistas, o que fica evidente é que o do Estado sendo o garantidor de uma sociedade; sem ele se vivenciaria o caos, a barbárie, a vida em sociedade e a própria existência da humanidade estariam ameaçadas. Portanto, os impostos são essenciais para garantir a existência do Estado.

A quem pertence os impostos?

Quando faço essa pergunta em sala de aula, a maioria dos alunos responde que os impostos pertencem ao governo. Para ajudar a responder essa questão, faço três perguntas correlacionadas: a quem pertence a taxa de condomínio pago pelos condôminos de um edifício? Ao zelador, ao síndico ou a todos os condôminos? E para que será destinado o dinheiro?
As respostas são simples: os impostos pertencem à sociedade da mesma forma que o valor total do condomínio pertence aos condôminos para a manutenção e melhora do edifício. A receita obtida com a arrecadação de impostos é utilizada pelo governo para prestar serviços à sociedade e, principalmente, para fazer a gestão da economia. O total de tributos recolhido dos agentes econômicos é devolvido em forma de gastos do governo que os usa para pagar seus funcionários e estes, quando recebem seus salários, consomem produtos e serviços na economia. O pagamento dos salários dos funcionários públicos é uma das maneiras utilizadas pelo governo para devolver os impostos à sociedade. Devemos estar conscientes de que os salários e os empregos gerados nos serviços públicos não devem ser privilégios de uma pequena elite que privativa para si e seus amigos aquilo pertence a todos os cidadãos.
 A importância do pagamento de salários para fazer a roda de a economia girar, pode ser, mais claramente, verificada em uma crise econômica, como na recente crise europeia (2008 até 2012), a redução de salários dos funcionários públicos de países como Grécia, Portugal e Espanha contribuiu para a recessão econômica atravessada por estas nações.
Muito se fala do valor dos impostos que o governo retira da sociedade, a chamada carga tributária, porém, na maior parte das vezes, não se fala dos gastos do governo. Os gastos do governo são essenciais para a gestão da economia. Pelos gastos, pode-se melhorar a distribuição da renda, fazer o crescimento econômico, aumentar o nível de emprego e reduzir a inflação.

A carga tributária

É representada pelo total de arrecadação do governo e, no Brasil, é organizada pela União (governo federal), Estados e Municípios. A carga tributária é composta por impostos, taxas e contribuições. Os impostos podem ser diretos e indiretos. Os diretos são cobrados sobre a renda (imposto de renda) e sobre propriedades (IPVA, IPTU). Os impostos diretos são pagos somente pelos cidadãos que possuam propriedade e renda pessoal que pode ser tributada com o sistema de taxas proporcional ao nível de renda (tabela do IR) ou valor da propriedade.

Os impostos indiretos são aqueles cobrados no processo de compra e venda de produtos e serviços e são pagos indistintamente por todos os cidadãos, independente do nível de renda e do poder aquisitivo. São chamados de impostos regressivos, pois os pobres pagam as mesmas taxas do que os ricos.

A carga tributária é medida por uma percentagem do PIB de um país e corresponde ao atendimento das necessidades de um povo. Países mais ricos atendem a uma gama maior de necessidades da população (previdência, saúde, educação, transportes públicos, estradas asfaltadas, lazer, segurança), enquanto que, em países mais pobres, é atendida uma quantidade menor de necessidades da população; bons exemplos são os de países como o Haiti e muitos outros do continente africano e, neles, as necessidades básicas, como segurança, não são atendidas. Veja, isso significaria dizer que a carga tributária de países ricos tem que ser mais alta do que nos países pobres.

É importante entender o conceito de carga tributária bruta e carga tributária líquida. A carga tributária bruta é representada pela taxação do governo para a sociedade por meio dos impostos, taxas e contribuições; a carga líquida é obtida retirando-se da carga bruta os valores que são devolvidas, imediatamente, para a sociedade, como subsídios, gastos com previdência, saques do FGTS, bolsa família e outros gastos, os chamados TAPS (transferências publicas e subsídios). Além dos TAPS, são descontados os juros pagos sobre a dívida pública. A seguir, é apresentado um quadro demonstrativo de TAPS e juros da dívida pública do Brasil referente ao ano de 2008.

Componentes das TAPS e juros da dívida pública como % do PIB em 2008
Benefícios do INSS
Aposentadoria e pensões dos servidores públicos
Saques do FGTS
LOAS RMV
Abono salarial
Bolsa famílias e outras transferências
Juros da dívida pública
6.9%
4.7%
1.5
0.55%
0.73%
0,88 %
6.2%

A análise do quadro mostra um conjunto de desembolsos do governo com exceção dos juros da dívida pública, destinados ao bem-estar da população e os gastos com bolsa família e outros são importantes instrumentos de distribuição de renda. O leitor pode questionar os gastos com os juros da dívida, perguntando: por que o governo paga esses juros? Não seria uma forma de privilegiar os banqueiros? É importante deixar claro que o dinheiro que financia a dívida pública pertence aos cidadãos e não aos bancos. Nós, cidadãos, aplicamos nosso dinheiro na poupança, em fundos de renda fixa e em outras aplicações financeiras que são destinados ao financiamento do governo. Se o governo não pagar os juros, não serão os bancos os prejudicados, mas, sim, todos os aplicadores, pessoas físicas ou jurídicas.

O conceito de carga líquida é o mais adequado para validar a carga tributária efetiva de um país. São os recursos que o governo pode utilizar, realmente, para prestar os serviços à sociedade e fazer a gestão econômica, os TAPS são transferências obrigatórias, muitos deles previstos em lei. O governo não pode utilizar esses recursos, livremente, para fazer a gestão econômica ou para prestar serviços a população. A seguir, tabela comparativa de carga líquida e carga bruta de alguns países.

Países
CTB
TAPS
CTB-TAPS
Juros líquidos
Ctl-juros
Alemanha
39,2%
18,1%
21,1%
2,4%
18,7%
Brasil
34,7%
15,4%
19,3%
6,2%
13,1%
Canadá
33,1%
10,9%
23,2%
0,7%
22,5%
Coreia do Sul
26,8%
3,6%
23,2%
-1,5%
24,7%
Espanha
32,7%
13,4%
19,3%
1,2%
18,1%
Estados Unidos
28,4%
12,6%
15,8%
2,1%
13,7%
França
42,3%
18,9%
23,4%
2,5%
20,9%
Grécia
31,6%
18,5%
13,1%
0,1%
13,0%
Hungria
39,9%
16,9%
23,0%
0,5%
23,5%
Irlanda
30,8%
10,3%
20,5%
-4,6%
25,1%
Itália
42,5%
18,6%
23,9%
4,5%
19,4%
Japão
28,1%
12,1%
16,6%
0,7%
15,9%
Noruega
42,0%
13,5%
28,5%
-13,3%
41,8%
Nova Zelândia
36,5%
10,5%
26,0%
-0.9%
26.9%
Polônia
34,1%
14,9%
19,3%
1,6%
17,7%
Portugal
36,5%
16,8%
19,7%
2,9%
16,8%
Reino Unido
36,5%
13,8%
22,7%
1,8%
20,9%
Suécia
46,8%
16,5%
30,3%
2,6%
27,7%
Fonte: Banco Central do Brasil, OCDE (Elaboração IPEA/CFP) apud IPEA nº 23. Carga tributária líquida e capacidade de Gasto público no Brasil.

Conforme demonstrado, o item Previdência contribui de forma significativa para o aumento da carga tributária, explicando a carga bruta elevada dos países ricos. Para reforçar tal ideia, apresentamos mais uma tabela comparativa sobre carga tributária dos países desenvolvidos e em desenvolvimento. (VARSANO, Ricardo e outros. Tributos no Brasil: uma Análise da Carga Tributária no Brasil. p. 17).

Além dos dados das tabelas, a revista Conjuntura Econômica da FGV, volume 66 de setembro de 2012, seção “Conjuntura estatística”. p. XIX, publica os dados de imposto líquidos sobre produtos menos subsídios, conforme segue;
Ano
Imposto líquido sobre produtos %
2002
16,1
2003
15,6
2004
16,5
2005
16,0

A carga tributária do Brasil é alta, equivalente a dos países desenvolvidos. Então, por que temos serviços de saúde e educação com qualidade inferior aos desses países?

Normalmente, quando comparamos a carga tributária o fazemos em termos relativos, um percentual do PIB. Esta forma de se comparar esconde muita coisa. É comum comparar o Brasil e a Noruega que possuem cargas acima de 30% do PIB e chegar a uma conclusão de que os serviços de saúde do Brasil deveriam ser iguais em quantidade e qualidade aos da Noruega.

O método mais adequado para se comparar é pela renda per capita um valor absoluto que mostra melhor a relação de recursos aplicados com a quantidade ou qualidade de serviços oferecidos, como demonstrado a seguir:

País
Renda per capita em dólar americano*
Carga tributária %**
Valor tributado em dólar americano
Noruega
97.255,00
42,0
40.847,10
Brasil
12.789,00
34,7
 4.437,78
Relação Noruega/Brasil
7,60
1,45
 9,20
*FMI – World Economic outlook database, abril 2011, apud WIKIPÉDIA–LISTA de países por PIB nominal per capita.
** IPEA opus cite. Elaboração própria.

Veja, o valor absoluto recolhido na Noruega é 9,2 vezes maior do que o recolhido no Brasil. Com a quantidade de dinheiro obtido na Noruega é possível contratar uma quantidade maior de médicos e enfermeiros, construir melhores hospitais. Essa é uma conta simples e podemos aplicar esse mesmo raciocínio com orçamentos familiares. Vejamos a relação entre um cidadão que recebe R$ 3.000,00 por mês e outro, que recebe R$ 15.000,00, supondo que cada um deles reserve um terço de sua renda para saúde, o primeiro terá R$ 1.000,00 e o segundo, R$ 5.000,00, para gastar com sua saúde. É muito provável que o segundo tenha uma quantidade maior de serviços médicos, com melhor qualidade (provavelmente) do que o primeiro.

Portanto, fica claro que uma comparação simples entre percentuais semelhantes de carga tributária não nos leva a supor que os serviços prestados pelos governos sejam equivalentes. Para melhorar a comparação, devemos levar em conta o nível de renda per capita da população que resulta em um tributo per capita, alto na Noruega e baixo no Brasil.

Quem paga mais impostos ricos ou pobres?

No Brasil, os pobres pagam mais impostos do que os ricos. Para aclarar esta afirmação, teremos de considerar o sistema tributário de um país, se os tributos são diretos ou indiretos. Os tributos diretos, conforme definido anteriormente, são cobrados sobre a renda e propriedades e são aplicados de forma progressiva. Isso significa que, quanto maior a renda, maior o valor do tributo. A conclusão a que se chega é que isso proporcionará uma maior justiça tributária, pois a tributação deverá levar em conta a capacidade de pagamento dos cidadãos para promover a justiça tributária.

Já, os tributos indiretos são cobrados de todos os cidadãos, indistintamente, não levando em consideração a capacidade de pagamento do contribuinte. São aplicados de forma regressiva. No Brasil, os pobres pagam mais impostos em proporção à renda do que os ricos, pois a proporção de impostos indiretos no total da arrecadação é maior do que os impostos diretos (imposto sobre a renda é de, aproximadamente, um terço da arrecadação total), conforme demonstrado na tabela a seguir:

IR: PJ e PF
IPI
IOF
CPMF
Finsocial
ICMS
Total
191.755
39.466
20.342
1.149
120,800
222.589
596.101
32,16%
6.60%
3,41%
-
20,26%
37,34%
100,00%
Fonte revista Conjuntura Econômica da FGV, “Conjuntura Estatística”, p. X e XI, abril de 2012. Elaboração própria. Dados do ano de 2008. Valores em milhões de reais.

Para maior clareza, ilustraremos com a ação de dois consumidores com níveis de renda diferentes, consumidor A e consumidor B, que recebem rendas de R$ 1.000,00 e de R$ 5.000,00, respectivamente. Sofrerão impactos diferentes da tributação sobre suas rendas.

Para entender os impactos em cada nível de renda, vamos estabelecer alguns critérios de consumo ou gasto da renda:

Quadro I

Consumidor
Renda $
Gasto com alimentação
Gasto com saúde
Gasto com educação
Gasto com transporte
Saldo
A
1.000,00
400,00
200,00
200,00
200,00
000,00
B
5.000,00
800,00
800,00
400,00
500,00
2.500,00

Como demonstrado, o consumidor A gasta toda sua renda com a compra de bens e serviços; o consumidor B gasta apenas metade de sua renda, ou seja, a renda do consumidor A será, totalmente, tributada, enquanto que, na renda do consumidor B, somente metade sofrerá tributação.

No Brasil, os pobres pagam mais impostos que os ricos, temos um grande número de pessoas com renda próxima a R$ 1.000,00, utilizada no exemplo, de acordo com os dados publicados na revista Conjuntura Econômica, p. VIII, o rendimento médio do pessoal empregado no ano de 2008 foi de R$ 1.226,35.

Quem deve pagar mais impostos? Quem tem maior capacidade de pagamento ou quem recebe os benefícios dos gastos do governo?

Essa pergunta nos leva a uma reflexão importante: é justo uma pessoa da classe E, com renda familiar por volta de R$ 700,00, pagar pela manutenção de estradas ou pela construção de grandes avenidas para atender às necessidades de proprietários de veículos, se eles não têm carros? O mais correto seria que aqueles que recebem os benefícios dos serviços prestados pelo Estado pagassem impostos referentes ao uso.

Então, os cidadãos que usarem os serviços que os demais não usam deveriam pagar por esses serviços e não sobrecarregar aqueles que não recebam tais benefícios.
Isso significaria justiça tributária, um dos princípios mais importantes, o principio dos benefícios, contido nas principais teorias de tributação.

Lembre-se de que, no Brasil, a maior parte da receita do governo tem origem na cobrança de impostos indiretos regressivos. Nesse sistema, os pobres pagam mais do que os ricos, mas na distribuição dessa receita os governos privilegiam as classes mais ricas. Veja o quadro relativo à distribuição de gastos sociais do Brasil para o ano de 1995 (FISHLOW, Albert. O novo Brasil. Saint Paul: São Paulo, 2011, p.113).
Setores sociais
Total de gastos em bilhões de R$
Destinado aos 20% mais pobres em bilhões de R$
Benefícios aos mais pobres %
Educação
19,9
3,6
18
Saúde
21,8
4,6
21
Benefícios de aposentadoria
67,6
4,5
7
Total
109;3
12,9
12
Tabela 4.7 – Distribuição de gastos sociais
Fonte: Banco Mundial, Brazil: attacking Brazil’s poverty, v. 2, p. 88.

Conforme demonstrado, existe um grande desequilíbrio na distribuição das receitas dos tributos, em favor dos mais ricos. O desequilíbrio mais gritante está nos benefícios das aposentadorias: apenas 7% dos recursos são destinados aos 20% mais pobres. Na educação superior PÚBLICA do Brasil, os pobres subsidiam os filhos dos mais ricos. Vejam o que Albert Fishlow fala sobre o assunto (op cit, p.94):
Eram transferências modestas (transferências do governo para o ensino público fundamental), em base per capita, se comparadas ao custo anual de US$12 mil por aluno de nível superior público brasileiro na metade dos anos 1990. Mais de um quarto dos desembolsos estatais foram alocados a menos de 2% dos estudantes, em 1995. Para alunos de ensino primário e secundário, as verbas comparáveis eram de US$676 e US$ 734. Isso conduziu o Brasil ao topo da escala internacional para as universidades, mas o deixou em posição muito baixa quanto ao ensino primário e secundário. Essa disparidade, maior que em qualquer outro país e ainda persistente, é um problema não resolvido. Para resumir, existe um considerável subsídio para filhos de ricos.

Outra forma de demonstrar o desequilíbrio da distribuição dos impostos, em favor Outra forma de demonstrar o desequilíbrio da distribuição dos impostos, em favor das classes de renda mais elevadas, é analisando os gastos públicos com transportes nas cidades brasileiras que tenham população superior a quinhentos mil habitantes. Nessas cidades, estudos feitos pela ANTP – Associação Nacional de transportes públicos –, fica claro que os gastos públicos com transportes individuais são de aproximadamente 15 vezes maiores do que os gastos com transportes coletivos.

Custos da Mobilidade
Tipo
Valor (bilhões de reais/ano)
Participação (%)
TC - Custo Individual 15
27,4
18
TC - Custo Social 15
0,8
1
TC - Total
28,2
19
TI - Custo Individual 17
110,4
73
TI - Custo Social 18
11,8
8
TI - Total
122,2
81
Total
150,5
100%
Custos da mobilidade por tipo (bilhões de reais/ano) – 2010
Custo individual do transporte coletivo – recursos gastos pelos usuários para utilização do sistema de transporte coletivo.
(16) Custo social do transporte coletivo – recursos gastos pelo poder público para o funcionamento do sistema de transporte público (porcentagem do valor da infraestrutura viária).
(17) Custo individual do transporte individual – recursos gastos pelos usuários do transporte individual
(18) Custo público do transporte individual – recursos gastos pelo poder público para o funcionamento do sistema de transporte individual (porcentagem do valor da infraestrutura viária).
Fonte: Relatório geral de mobilidade urbana 2010- ANTP.

É considerado transporte individual, as locomoções realizadas utilizando automóveis, motocicletas e bicicletas.
No ano de 2010, o governo gastou onze bilhões e oitocentos milhões de reais para garantir a utilização de automóveis, motos e bicicleta como meio de transporte, enquanto que para garantir o transporte coletivo o governo gastou apenas oitocentos milhões de reais. Este gasto foi feito na intraestruturas viária e na organização do tráfego, a infraestrutura são os espaços ocupados, isto é, as ruas, semáforos, sinalização etc. A organização refere-se ao órgão de trânsito com seus prédios e pessoal.
O quadro mostra apenas gastos diretos, se considerarmos os gastos indiretos como os acidentes de trânsito e poluição, os gastos sociais com transportes individuais aumentarão, com certeza.



[1] Existem algumas definições de desenvolvimento econômico, segundo Bresser Pereira, “o desenvolvimento é um processo de transformação econômica, política e social, por meio do qual o crescimento do padrão de vida da população tende a tornar-se automático e autônomo. Trata-se de um processo global. em que as estruturas econômicas, políticas e sociais de país sofrem contínuas e profundas transformações” (PEREIRA, Bresser, apud DAMASCENO, Aderbal Oliveira. Desenvolvimento Econômico. Alínea, p.21). Para haver desenvolvimento econômico, é necessário que existam mudanças na estrutura econômica e na distribuição do produto. Portanto, a renda nacional, resultado do trabalho de todos, com vista na melhora do bem-estar econômico e social da população de um país.

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